Cinco meses da tragédia de 15 de fevereiro em Petrópolis e muito ainda tem que ser feito

“A pior guerra que existe é a do homem contra a natureza”. Esta é uma das frases que estampa a frente do Colégio Estadual Rui Barbosa (CERB), no Alto da Serra em Petrópolis. O local era um dos principais pontos de apoio do maior desastre socioambiental que o município já presenciou. Hoje, tragédia do dia 15 de fevereiro, que destruiu diferentes localidades de Petrópolis, completa cinco meses. E, os 152 dias não foram suficientes para resolver os problemas das vítimas, que perderam familiares e ficaram desabrigados ou desalojadas.
Durante o desastre, a costureira Josiele Carvalho foi uma das mais de 1.200 pessoas que precisaram recorrer a um abrigo. “Eu sai dos abrigos porque eles precisavam ser fechados, e mesmo assim, no período que eu estive neles, a todo momento eles me faziam mudar de local, por conta das aulas que iriam voltar. Tivemos que nos virar para encontrar um lugar para ficar e depois de dois meses e meio, com muito sacrifício, eu consegui uma casa, mas ainda está tudo muito difícil”, desabafou a costureira.
No dia 15 de fevereiro, Josiele estava na casa em que morava na Rua dos Ferroviários. Quando a chuva começou, ela saiu do imóvel com os filhos e foi procurar um local seguro. Mesmo assim os três filhos ficaram soterrados, mas felizmente ela conseguiu resgatá-los. Josiele perdeu amigos, vizinhos e dois irmãos.
Cinco meses após o desastre, ela ainda precisa lidar com os traumas que não só ela, mas os filhos, também sofreram. “Meu filho de cinco anos foi diagnosticado com depressão, ele não consegue ter um convívio bom em creche, porque as perdas que tivemos traumatizaram muito ele”, disse Josiele Carvalho.
A Escola Municipal José Fernandes da Silva (EMAS), também ficou marcada pela tragédia. Evelyn Luiza, de 11 anos, perdeu a vida em um deslizamento de pedras que atingiu a escola. O marceneiro, Elizier Manoel da Silveira, pai de Evelyn, além dos traumas físicos, conta que em nenhum momento recebeu apoio. “Não tivemos assistência alguma, nada foi feito. A minha dor é de pai para filha”, esclareceu o marceneiro.
A costureira Vânia de Souza morava em uma casa na Servidão Mario Barbatt, que fica atrás do EMAS. Há apenas dois meses, Vânia conseguiu uma nova casa que ela teve que custear, pois não teve acesso ao Aluguel Social. “Perdi muitas coisas por causa da água, mas mesmo assim eu tenho muito medo de alguém entrar na minha casa e pegar o pouco que sobrou. Eu só quero voltar para a minha casa, não quero continuar no Aluguel Social. Quero ficar onde morei por 53 anos”, disse a costureira.
Na Servidão Frei Leão o cenário ainda é assustador. No local foram registradas 93 mortes e pelo menos 54 casas ficaram devastadas. Cinco meses depois da tragédia o sentimento é de tristeza e de medo em perder o pouco que sobrou. Para a funcionária pública Marisa Pereira Bernardes, olhar para o local em que vivia e ainda não ver mudanças traz uma dor profunda. “A gente quer obras, um planejamento e posicionamento do governo. Queremos saber o que vai ser feito, tendo em vista que a região ainda apresenta riscos”, finalizou a funcionária pública.
A balconista Cristiane Gross da Silva, perdeu oito familiares, entre eles o neto de cinco anos e a filha de 19. Os corpos foram resgatados pelo marido, amigos e voluntários da balconista. As dificuldades ainda continuam e nada foi feito. “Nós não somos interessantes para a prefeitura, pois não temos pontos turísticos na região. Até hoje não consegui viver meu luto”, esclareceu.
“Gente pelo amor de Deus, 93 pessoas morreram aqui! O que mais precisa para eles darem a atenção que merecemos? É um descaso total. A casa para mim é o de menos. Eu construiria outra ou ficaria até em baixo da ponte, se pudesse ter todo mundo que perdi aqui comigo”, desabafou a balconista.
Mesmo com imóveis destruídos contas continuam chegando
Moradores como o aposentado Antenor Alves de Alcântara, mesmo com os imóveis interditados, ainda recebem a cobrança da conta de luz. “Mesmo sem luz eles me cobraram taxa mínima, e me mandaram uma cartinha falando que meu nome iria para o Serviço de Proteção ao Crédito (SPC)”, disse o aposentado.
De acordo com o barbeiro Rafael de Mattos dos Santos, a Companhia Municipal de Desenvolvimento de Petrópolis (COMDEP), quase não foi ao local após o desastre. “Hoje (14), é a primeira vez que vejo as equipes da COMDEP aqui, parece que sabiam que ia ter reportagem e vieram limpar a rua e pintar cinco postes”, desabafou o barbeiro.
Cento e cinquenta e dois dias após o dia 15 de fevereiro, que trouxe muita dor, perdas e luta por direitos básicos, as vítimas do maior desastre socioambiental de Petrópolis querem apenas uma coisa: justiça.
Por Gabriel Faxola