Após seis meses da tragédia localidades de Petrópolis permanecem com cenário de destruição

No Morro da Oficina nada mudou desde os deslizamentos há seis meses. Na verdade, parece que a região parou no tempo após a tragédia. Os escombros refletem a demora do poder público em auxiliar parte da população petropolitana, que teve perdas materiais inestimáveis, mas que principalmente, viu familiares, amigos, vizinhos e desconhecidos perderem a vida em uma fração de segundos. O cenário ainda visto nas regiões mais afetadas do 1º distrito de Petrópolis é impressionante e ao mesmo tempo desolador. No Morro da Oficina, que fica no Alto da Serra e onde morreram 93 pessoas, parte das casas se mantém em pé, como se representassem a força e o desejo de recomeço de quem permanece sem respostas e apoio até hoje.
Na sala de estar de uma das residências, as cadeiras e o sofá permanecem no mesmo lugar. Na geladeira os nomes dos integrantes de uma das famílias que viviam na região, ainda estão gravados na porta do eletrodoméstico, e se tornaram um contraste com o que já existiu na localidade, até mesmo algumas roupas continuam penduradas no varal. A devastação está em toda parte, assim como as lembranças de quem vivia no local. com cerca de 1.140 metros de altitude, o nome morro da oficina foi dado a localidade por conta das oficinas ferroviárias instaladas na região. muitos dos moradores que viviam ali, eram de uma mesma família.
Assim como aqui no Morro da Oficina, em outras localidades atingidas, o cenário da tragédia também se camufla em meio à vegetação e o que marca essas regiões, é o silêncio, que presenta a tristeza dos moradores que perderam suas famílias e residências.
No Chácara Flora, onde mais de 25 pessoas morreram, a situação é similar. A barreira exposta na localidade representa a falta de apoio aos moradores. Além do sentimento de perda, os petropolitanos já começaram a ficar angustiados com a proximidade do período chuvoso. Já na parte baixa do alto da serra, próximo à Rua Teresa, o cenário é diferente e apresenta indícios de normalidade, mas basta olhar para as montanhas, que a lembrança da devastação se torna novamente presente, assim como a iminência de uma nova tragedia anunciada.
Simone Mayworm é comerciante e teve à casa inundada pela água e retrata o medo de passar por dias chuvosos. “Só de medo, medo, angústia, preocupação. Porque a prefeitura não fez nada. Não demoliram as casas que devem demolir, não fizeram dragagem de água, captação de água. A minha casa por sinal, tiramos 30 caminhões de terra. A água que veio de cima, veio toda pra minha casa, porque a rua não tem nem bueiro. Só temos bueiro na entrada na minha casa e ninguém fez nada pela gente. É muito triste, porque é o suor de uma vida né. Como a gente vai deitar na cama com a cabeça tranquila com esse cenário.”, concluiu.
Rodrigo Azevedo é geólogo e ressalta que não só as regiões atingidas estão vulneráveis a outros deslizamentos. Caso não sejam feitos trabalhos de prevenção, como o treinamento e orientação da população, obras de contenção nas encostas e o mapeamento das áreas consideradas de risco, novas tragédias podem ocorrer. “A geologia de Petrópolis é complexa pois são vales com grandes inclinações. Esses vales são feitos basicamente de fragmentos rochosos e que estão presos a terra. Quando esse terreno cede, a região fica fragilizada e como chuvas como a de fevereiro, se tornam cada vez mais frequentes, locais como Independência, Quitandinha, também podem registrar deslizamentos. É preciso uma união entre os agentes públicos, defesa civil e à população, para que por meio de treinamentos, orientações, ocorrências como essas não aconteçam novamente”, esclareceu.
Marcelo Alcântara, vigilante, perdeu oito familiares no dia 15 de fevereiro e volta diariamente à localidade, para olhar a casa do pai, Antenor de 65 anos. “A gente tem que vir aqui sempre, para ficar de olho nas coisas. Meu pai colocou um cachorro ali na casa dele, tem que vir tratar, a gente veio tratar. E olhar também, olhar pelos vizinhos também. Tem saque acontecendo. Semana passada teve um saque, estavam privando uma caixa d’água, fizeram devolver. A situação é essa, nada foi feito aqui. Você vê a cidade toda. Você vai no centro de Petrópolis e não diz que enchente aconteceu. Agora vai começar a Bauernfest, os turistas nem saberão o que aconteceu. Mas se vier para o lado de cá, nada foi feito até agora”, informou.
Apesar de já terem passado seis meses da tragédia e dos inúmeros traumas, o desejo de Antenor, que viveu 65 anos no morro da oficina permanece o mesmo: voltar para casa. “Para o futuro, espero voltar para casa. Moro aqui há 63 anos e quero voltar pra minha casa. Não será a mesma coisa, mas peço apoio dos agentes públicos para voltar pra casa”, concluiu Antenor.
Na terça-feira (16), a TV Correio da Manhã trará uma nova reportagem sobre os impactos da chuva em Petrópolis, e o cenário atual na Rua do Túnel e do Caxambu, regiões que também foram muito afetadas.
Foto e texto: Richard Stoltzenburg